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quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

O desfecho

Pra finalizar...
O homem do canivete era seu Manoel, segue a ficha:
Manoel Almeida, aproximadamente cinquenta anos, casado há trinta e oito, nordestino, pai de um casal (que de acordo com ele são lindos), trabalhador rural.
Agora como eu o conheci...
Há uns dois anos atrás estava ajudando na papelaria, época de volta às aulas é uma loucura!
O que não é surpresa pra ninguém, é minha mania de falar e pegar amizade com as pessoas que atendo (muitas delas se tornaram íntimas, e hoje são realmente amigas) e foi chamando a senha vinte e quatro que este senhor caiu na minha rede!
Parece mentira, mas me lembro do número da senha. Assim que o chamei ele logo fez uma piadinha com um sotaque que vou tentar descrever : - Pelamor de Jésuis minina rali baxu ésse numro, qué que vaum pensa di mim? rs
Soltei um risadinha e me lembrei do meu pai (um dia explico), já imaginando o que viria na sequência.
Pra resumir o que já deveria ter sido um resumo, fiquei uns quarenta minutos atendendo e conversando com o Mané*, foi o tempo suficiente pra saber quase toda sua vida e me encantar com ela.
Ele havia me explicado que na cidade em que morava assim como em boa parte do nordeste, a terra era seca demais, por isso fazia três anos que não conseguia emprego já que ele trabalhava com plantações.
Muitos homens, pais de família, deixam suas cidades para trabalharem em safras no interior paulista, e foi assim que o Mané* veio parar aqui.
Durante a proza eu o ajudei a escolher os materiais que levaria pra seus filhos, uma menina de doze anos e outro de oito. Escolhemos e separamos os cadernos, lápis, estojos e tudo mais tinha direito, nada do mais caro pois ele não queria luxo (dizia exatamente assim) mas tudo muito bonito pra combinar com o jeitinho que imaginei que fossem os filhos.
Era fim de safra e os trabalhadores estavam esbanjando dinheiro no comércio, precisavam aproveitar, pois no dia seguinte todos embarcariam de volta pra casa.
Atender o Mané foi tão agradável, que ri praticamente os quarenta minutos com as piadas que me contava cada vez que dizia o preço de alguma coisa, e foi rindo que ele se dirigiu ao caixa, e rindo ele foi embora...
Rindo eu estava, até me dar conta de que ele havia deixado a mercadoria na papelaria, e é exatamente aí que começa a outra parte da história.
Corri atrás dele mas, assim que cheguei na praça, meu DEUS!!! Haviam tantos nordestinos lá que seria praticamente um milagre encontrá-lo (essa é a parte em que eu fico triste).
Voltei toda chateada pensando na decepção que ele teria quando fosse revirar suas sacolas (que não eram poucas) e desse conta do acontecido. Já pensou se não conseguisse voltar pra buscar os materiais dos seus filhos?
Cheguei em casa e contei pra minha mãe, logo depois me lembrei do meu tio que trabalhava na Usina e que talvez pudesse me ajudar.
Batata!
Consegui o contato do chefe dos cortadores, o cara que iria acompanhá-los na viagem de volta. Por sorte, ele conhecia o Sr. Manoel Almeida, e fez a gentileza de buscar as sacolas do Mané* e entregá-las em mãos.
Pra terem idéia da loucura que foi tudo isso, o ônibus deles iria sair às 12:00, o cara chegou na papelaria 11:30, nesse meio tempo eu já estava com o coração na mão.
Depois de alguns meses reencontrei o chefe deles (o salvador da pátria rs), ele me descreveu a felicidade do Mané ao saber do meu esforço em entregar suas coisas, feliz mesmo fiquei eu, em saber que tudo que escolhi e separei com tanto carinho chegaria nas mãos de seus donos.
Ah, já ía me esquecendo, assim que chamei a senha vinte e quatro, a primeira coisa que vi foi algo dando reflexo nos meus óculos, era ele, o canivetão cromado do Mané! E foi justamente por ele que o reconheci atravessando o sinal depois de dois anos.
Foi um prazer te conhecer companheiro.

M.C.N.

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